A noite de abertura do 1º Webinar do Direito não poderia ter tido melhor desfecho. Com três convidados especialistas em suas áreas, o evento promovido pelo curso do campus Canoas teve duração de três horas e abrangeu temas como os direitos fundamentais, adaptação do sistema judiciário à pandemia, punições ao descumprimento de decretos restritivos e os desafios do trabalho policial na crise do novo Coronavírus.
Advogado criminalista, o Dr. Lúcio de Constantino começou falando sobre a liberdade de ir e vir dos cidadãos. O tema tem sido debatido com frequência, diante das restrições impostas por estados e municípios. "O habeas corpus é uma figura de garantia da locomoção, principalmente contra constrangimentos ilegais. No entanto, estamos em um momento excepcional e o posicionamento do Superior Tribunal Federal (STF) garantiu autonomia aos prefeitos e governadores", explicou o professor, ao lembrar que as instâncias superiores estão negando os pedidos de habeas corpus que pleiteiam autorização para transitar livremente em cidades que cumprem o chamado "lockdown".
O "lockdown" é a restrição absoluta do trânsito de pessoas nas cidades. Neste caso, apenas serviços essenciais são mantidos, como hospitais, mercados e farmácias, por exemplo. "A pandemia investe contra a saúde, que é o bem maior. Então, a partir disso, em razão da coletividade, pode ser restringida à circulação", apontou o convidado, que afirmou categoricamente que o direito à liberdade é fundamental, mas não se sobrepõe ao direito à vida e ao direito à saúde.
Nesse mesmo sentido, o professor do curso Paulo Dalla Corte, segundo palestrante da noite, destacou que medidas mais rígidas podem ser tomadas em locais que estão sofrendo com a baixa adesão do isolamento social. "Nas regiões mais afetadas, pessoas estão descumprindo os decretos restritivos. Sendo assim, há uma legalidade extraordinária até mesmo para detenções, em último caso", observou o docente especialista em direito penal.
Exemplificando através de atos práticos, o professor falou de alguns casos de infrações de menor potencial ofensivo em meio ao estado de emergência e excepcional em que o país vive. "Esse é um momento muito importante e inédito para todos, inclusive para nós, professores. Para que possamos ter uma melhor compreensão e da forma como vamos conduzir o compartilhamento dos nossos conhecimentos em meio a essa crise pandêmica, alertando para que não haja abusos dos cidadãos que, por ventura, venha infringir a lei ou desacato às autoridades e agentes e nem mesmo o excesso por parte das autoridades", destacou Dalla Corte.
Desafio para o sistema judiciário e para a polícia
As restrições impostas pelo distanciamento social fizeram com que agentes de segurança e demais aplicadores da lei tivessem que se adaptar à nova realidade. Apesar de já existirem processos eletrônicos, o judiciário precisou aderir às audiências virtuais, até então pouco utilizadas pelo sistema. Para o Dr. Lúcio de Constantino, isso é mais um indicativo de que a pandemia vem para trazer uma evolução significativa ao judiciário brasileiro. "É uma espécie de virtualização do processo penal. Nos Estados Unidos, já há um uso maior de inteligência artificial e isso deve ser ampliado no Brasil. É algo que veio para ficar e teremos que conviver com isso", ressaltou.
Na atuação das polícias, as novas tecnologias tiveram papel positivo e também negativo. A delegada Nadine Anflor, primeira mulher a chefiar a Polícia Civil do Rio Grande do Sul, utilizou seu momento de fala para apresentar o trabalho que vem sendo feito pela corporação durante a pandemia do novo coronavírus. Segundo ela, a PC-RS precisou se reinventar. "É um desafio mundial, ninguém estava preparado para que isso acontecesse. Em poucos dias, precisamos nos adaptar, alterar operações e processos", contou.
De acordo com Nadine, os investigadores e demais agentes da corporação não estavam acostumados com os cuidados necessários para evitar a contaminação e propagação da COVID-19. "Nunca precisamos utilizar esses equipamentos de proteção e muito menos a higienização constante", confessou a delegada, que usou a Operação Magna Ópera para exemplificar a complexidade de uma investigação nesse período. "Os investigadores precisavam pegar ou entregar documentos como em um drive-thru", brincou.
Operação Magna Ópera e mais espaço para as mulheres
A delegada Nadine aproveitou a palestra para comentar sobre os desafios enfrentados para deflagrar a Operação Magna Ópera, que envolveu mais de 200 policiais civis e desarticulou um esquema de lavagem de dinheiro de uma facção gaúcha. "Somos um serviço essencial, então é importante deixar claro que seguimos trabalhando, e essa operação reforçou isso", disse. No dia, 10 suspeitos foram presos e mais de R$ 16 milhões em bens foram apreendidos pelas equipes da Polícia Civil.
Ela também apresentou dados que mostram que a sua gestão faz um trabalho que busca dar mais espaço às mulheres na corporação. "É importante que tenhamos uma Polícia Civil composta por homens e mulheres, trabalhando em conjunto, com olhares diferentes. Atualmente, 38% do nosso quadro é de mulheres", mostrou Nadine. "Meu compromisso e o meu objetivo é que muitas outras mulheres cheguem a um cargo de chefia, naturalmente, e que isso não seja mais motivo de notícia", finalizou.
A mediação das palestras foi da coordenadora do curso de Direiro, Francele Marisco. A programação do Webinar do Direito segue nesta quinta-feira, 21, com as palestras Os Reflexos da Pandemia na Jurisdição Criminal em Segundo Grau, às 19h, com o Desembargador do TJ/RS. José Conrado Kurtz de Souza; Observatório de Direitos Humanos: Uma Análise dos Reflexos do Estado de Calamidade Pública na COVID-19, às 20h, com o professor André Cezar, e Direito Médico e o Emprego do Direito Penal - Constitucional em Época de Pandemia: Causas e Consequências, às 21h, com o professor João Alexandre Netto Bittencourt.
Leonardo Magnus
Jornalista Mtb 19305/RS
André Valdez
Estudante de Jornalismo da Ulbra Canoas