Em um momento de exceção, como é a pandemia do novo Coronavírus, os profissionais da saúde têm que se adaptar aos desafios impostos pela grande procura de pessoas ao sistema público de saúde. Aline Correa Danieli, 34, mestranda do Programa de Pós-graduação em Promoção à Saúde, Desenvolvimento Humano e Sociedade da Ulbra (PPGProSaúde), é uma das enfermeiras que estão na linha de frente do combate ao vírus. Moradora de Peixoto de Azevedo, no interior do Mato Grosso, ela faz parte de uma equipe do Centro Operacional de Emergência (COE) da COVID-19 no município.
Especializada em saúde coletiva e enfermagem do trabalho, Aline fez um curso de capacitação do Ministério da Saúde, em 2018, chamado epiSUS Fundamental, que segue uma metodologia epidemiológica criada por militares nos Estados Unidos e é reconhecido internacionalmente. "Os profissionais formados nesse curso ficam cadastrados no sistema e podem ser convocados em caso de surtos de doenças e epidemias", explica a enfermeira, que foi convidada pelo secretário municipal de saúde da cidade para fazer parte da equipe do COE assim que a doença ganhou status de pandemia.
Desde 2008 na cidade, Aline diz que teve a oportunidade de ir para outros lugares, mas preferiu permanecer no município de pouco mais de 30 mil habitantes. "Eu passei em outros cinco concursos, mas optei por ficar aqui porque é um povo muito acolhedor", conta a profissional de saúde, que viu na região uma chance de ter um contato próximo da realidade do mestrado que viria a realizar depois. "É uma população vulnerável, muitos profissionais do sexo, usuários de drogas, pessoas que trabalham em locais sem condições mínimas de segurança, e eu vejo essa necessidade do desenvolvimento humano e da educação para que haja a promoção de saúde", revela a mestranda.
Dificuldades para estudar e início difícil
Morando em regiões com pouco acesso e distantes, a mestranda da Ulbra começou sua trajetória na enfermagem por influência da mãe. "Eu não tinha muito interesse no começo. Iniciei o curso e acabei me apaixonando pela profissão. Desde então, sempre soube que era aquilo que eu queria continuar fazendo por toda a minha vida", confessa.
Na época, morando em Guarantã do Norte-MT, ela iniciou o curso técnico em enfermagem e, após concluí-lo, fez vestibular para a Universidade Estadual de Mato Grosso (Unemat) e foi aprovada no campus de Cáceres. "Os dois primeiros anos da minha formação foram bem difíceis, pois a minha família não tinha condições financeiras, então cheguei a passar fome, residi na casa de conhecidos porque não tinha dinheiro para pagar aluguel", relembra.
Após o terceiro ano na cidade, conseguiu passar na seleção do Hospital Regional de Cáceres e passou a trabalhar à noite, como técnica de enfermagem, no setor de pediatria, e estudava durante o dia. "Eu saía do plantão, pegava uma bicicleta e andava de 5 a 6km para ir até uma unidade básica de saúde (UBS) ou para a universidade, que também era bem distante de onde eu trabalhava."
Amor pela enfermagem e interesse pelo mestrado
"Eu valorizo muito a minha formação, pois eu sei bem todos os sacrifícios que eu tive que passar para conseguir cursar Enfermagem. Sempre soube que eu queria ajudar pessoas. A enfermagem é isso: um cuidar próximo, cuidar dos outros, de forma humanizada", destaca a mestranda, que acompanhava o site da Ulbra desde 2011, aguardando uma oportunidade de cursar o mestrado em módulos do PPGProSaúde. "Quando eu cursei o primeiro módulo agora, eu me senti realizando um sonho."
Com o avanço da pandemia, Aline lamenta que não tem tido o tempo necessário para se dedicar aos estudos do mestrado. No entanto, ela ressalta que o aprendizado tem sido constante no dia a dia de seu trabalho. "É uma aprendizagem ímpar. Você aprende a trabalhar sob pressão, aprende a filtrar e sintetizar o que chega de informação, aprende a manter a calma e a ter um pensamento racional para implantar medidas e estratégias para conter a progressão do número de casos da COVID-19", observa.
Trabalho no Centro Operacional de Emergência
Fazendo parte de uma equipe que é o elo entre a cidade e o estado, repassando informações e protocolos, Aline conta que o momento tem sido de muito cuidado e dedicação. "O clima é de receio. Porém, vemos um grau de comprometimento grande entre os colegas. É algo que estamos construindo juntos por ser muito novo. Erramos, acertamos, mas é um momento de união e comprometimento", frisa.
De acordo com ela, outra dificuldade é controlar a mente e o corpo. "É um nível de cobrança muito alto, exigente, fisicamente e psicologicamente. Nós também temos família e, nesse momento, acabamos não tendo tempo para elas. Acabo sendo muito mais a Aline enfermeira do que a Aline mãe, a Aline esposa, a Aline filha", lamenta.
No entanto, ela destaca que, apesar de assustador, o trabalho também é gratificante. "É ótimo ver que as ações estão dando boas respostas. Até o momento, no município, não temos casos confirmados, apenas suspeitos. Então, apesar deste peso da responsabilidade e de ser algo atípico, que não imaginávamos enfrentar, estamos conseguindo passar tudo juntos", comemora a enfermeira.
Para Aline, quando a pandemia passar, ela será uma nova profissional da saúde, com uma visão diferente, com uma visão mais coletiva, pois todos são importantes e têm um papel importante nesse processo. "Todos contribuem de alguma forma e ajudam a não sobrecarregar o trabalho do colega. Acredito que isso irá nos fortalecer como profissionais e humanos", finaliza.
Leonardo Magnus
Jornalista Mtb 19305/RS