Medicina Veterinária
Mitos e verdades na relação entre humanos e pets
Especialista desmistifica questões e alerta sobre cuidados necessários
Existe uma regra segura para a convivência de cães e gatos com bebês? Beijar a boca do pet traz riscos para a saúde? Dividir a cama com animais de estimação pode auxiliar no aparecimento de doenças? Pelos estimulam a incidência de alergias? Será o ronronar dos felinos motivo de tanta preocupação?
São inúmeras as questões que rondam a relação entre humanos e animais de estimação, que, mesmo os tutores mais dedicados, em algum momento, já devem ter se perguntado até que ponto a convivência cada vez mais próxima entre as espécies é benéfica à saúde e bem-estar dos envolvidos.
Para desmistificar algumas questões e alertar sobre cuidados necessários na rotina diária com os pets, a médica veterinária Cristine Dossin Bastos Fischer, docente do curso de Medicina Veterinária da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), esclarece as dúvidas mais pertinentes de tutores e apaixonados por animais de estimação.
A especialista, mestre em Ciências Veterinárias e doutora em Biologia Celular e Molecular Aplicada à Saúde, atua como professora adjunta nas disciplinas de Medicina de Cães e Gatos II, Parasitologia Veterinária I e Parasitologia Veterinária II, na Ulbra Canoas (RS), onde exerce, também, a função de coordenadora dessa graduação. E é através da experiência adquirida na área clínica veterinária, principalmente no atendimento a caninos e felinos, que Cristine esclarece os questionamentos abaixo com propriedade.
- Mulheres grávidas podem ter contato com gatos?
Quando o assunto é gestante, é comum as pessoas pensarem na Toxoplasmose, doença transmitida por um protozoário, que tem como hospedeiro principal o felino. Existem várias formas de contaminação por este agente, entre elas, as fezes contaminadas dos gatos. Tutores que possuem seus pets domiciliados e bem cuidados, raramente irão se contaminar pelo toxoplasma. É muito mais frequente a transmissão por verduras mal lavadas e carne mal passada, que contém formas infectantes, do que pelo animal. Mesmo que o felino tenha o agente, ele só irá eliminá-lo uma vez, durante a primeira infecção. Quando o pet defeca na caixa de areia, o cisto precisa de no mínimo 24 horas para se tornar infectante no meio ambiente, portanto, se esta é higienizada diariamente, o risco de contaminação é eliminado.
- Animais de rua podem oferecer risco à saúde humana?
Embora existam zoonoses transmitidas dos animais para o homem, não existe o risco de ser contaminado por um ao passar por ele na rua. Os perigos relacionados a cães e gatos que vivem nas vias são mordidas. É claro que tanto felinos quanto caninos nesta condição possuem doenças que podem infectar os seres humanos, mas a partir do momento que alguém decide adotá-los e procura um médico veterinário para avaliação, recebendo o diagnóstico e providenciando tratamento, estará eliminando as chances de contaminação.
- O ronronar dos felinos deve ser motivo de preocupação?
O ronronar emitido pelos felinos está relacionado aos músculos da faringe, geralmente associado às sensações de bem-estar e satisfação. Alguns animais com muito medo ou dor extrema podem emitir este som, o que causa a oscilação desta sensação, que em geral está ligada a sentimentos de felicidade.
- A convivência com animais de estimação melhora o comportamento de crianças autistas?
Esta é uma verdade não só para crianças autistas, mas inclui também blocos de saúde, tanto física como de bem-estar emocional, pessoas com depressão e dificuldade de relacionamento com outras pessoas. Na medicina veterinária, este contato é chamado de Terapia Assistida com Animais, que traz muitos benefícios para o tratamento do autismo e doenças psíquicas e neurológicas.
- Beijar a boca do pet ou receber lambidas nos lábios acarreta riscos para a saúde humana?
Existe toda uma microbiota de cavidade oral humana e animal que não deve ser compartilhada entre ambos. Sabemos que o beijo é uma demonstração máxima de afeto, mas nos pets ele deve ser evitado, encontrando outras formas de manifestação dos sentimentos.
- É saudável criar cães e gatos como filhos?
Mesmo existindo um amor incondicional dos humanos pelos pets, antropomorfizar o animal, fazendo com que ele tenha toda função, sentimento e expectativa das pessoas, transfere para o pet uma coisa que ele não é. Reflete para o cão ou gato algo que não é da sua natureza. Amar é deixar que ele seja e se expresse da forma como realmente é. Humanizar é um caminho perigoso.
- Dividir a cama com animais de estimação pode auxiliar no aparecimento de doenças?
Não há a necessidade de o pet dividir a mesma cada com o tutor. O ideal é que ele tenha seu espaço. Caso não se abra mão disso, é importante que o cão ou gato esteja com toda questão protocolar vacinal, os vermífugos e cuidados de pelagens. Não existe um risco maior.
- Pelos estimulam a incidência de alergias?
Dentro dos diferentes alérgenos, responsáveis pelas alergias e reações de hipersensibilidade, a caspa canina, felina e humana, pelo e ácaros do ambiente, podem ser grandes estimulantes, o que varia de acordo com os fatores geneticamente determinados de cada indivíduo.
- Gatos transmitem ou causam asma?
Felinos não transmitem asma, o que acontece são casos onde uma pessoa hipersensível aos alérgenos apresentar reação pelo contato com os animais.
- Recém-nascidos podem ter contato com animais de estimação?
Deve existir um cuidado maior no meio ambiente onde existe um pet e que irá receber um bebê, até para evitar ciúme por parte dos animais de estimação. A recomendação dos neonatologistas é que exista cuidado na introdução e que ela seja gradativa na vida de ambos, para evitar acidentes, como mordidas.
- Dividir a rotina diária com animais traz benefícios para a saúde do coração?
Sim! Existem vários estudos comprovando que a interação entre humanos e animais melhora as questões cardiovasculares, psicossociais e casos de depressão. O convívio entre ambos proporciona muitos benefícios pelo fato da interação e passeios, que auxilia as atividades físicas.
- Pets auxiliam no tratamento da depressão?
Sim! Não só no tratamento da depressão, como na autoestima e questões psicossociais.
- Cães podem comer alimentos humanos ou específicos para sua raça?
Os animais possuem, assim como os humanos, a necessidade diária de receber nutrientes indispensáveis para a sua alimentação. Muitas vezes uma refeição caseira não consegue prover tudo que os pets precisam, por isso é que são recomendados os alimentos industrializados ou com composições indicadas por médicos veterinários especialistas em nutrição.
- Mordidas e arranhões podem causar infecções?
A cavidade oral possui uma série de bactérias que são inoculadas através de mordidas e arranhões, causando infecções. A recomendação nestes casos é que se lave a região com água e sabão, e, conforme a necessidade, procurar atendimento médico.
- Cachorros transmitem sarna aos humanos?
Existe uma sarna canina e outra felina que podem ser transmitidas aos seres humanos, as zoonoses, tratadas como Escabiose Animal, ou seja, sarna humana de origem animal.
- Cada ano humano corresponde a sete anos do animal?
Na verdade, essa é uma regra criada para atender os anseios das pessoas. Cães de porte pequeno sobrevivem mais que os grandes, o que torna impossível estabelecer uma regra exata. Alguns autores consideram o primeiro ano de vida do animal como 14/15 anos humanos, que seria a fase da puberdade, utilizando a partir deste ponto outras faixas etárias.
- Algumas raças precisam ter o rabo cortado enquanto outras não?
O corte de rabo e orelha é proibido desde 2013 através de Resolução do Conselho Federal de Medicina Veterinária por ser uma questão apenas de preferência estética. Os profissionais que realizam essa prática estão sujeitos a denúncias e processos no CRMV da sua região.
- Cães são apegados às pessoas e gatos ao lar?
Caninos e felinos são diferentes. Cada um possui características, comportamentos sociais e necessidades específicas da sua espécie, o que muda são as manifestações de afeto. O gato possui uma rotina distinta, onde tem os anseios básicos atendidos dentro de casa, enquanto o cão apresenta maior desejo por passeios. Ambos os pets, são apegados aos seus tutores, o que diferencia são as formas de demonstração de sentimentos.
- Carne crua pode causar doença nos pets?
A carne, assim como outros alimentos crus, pode conter os cistos de toxoplasmas, expondo o animal ao risco de contrair a doença.
- Animais de estimação podem usar o mesmo shampoo, sabonete e creme dental que os humanos?
Existe uma linha dermatológica e bucal específica para os animais que trazem em sua fórmula o pH ideal às particularidades de cada espécie. O uso de produtos inadequados pode causar reações adversas na pele de um pet, como, por exemplo, o uso de um shampoo humano que contém mais ácido.
- Roer ossos de galinha pode ser prejudicial?
O problema dos ossos é a questão de ingestão de corpo estranho que pode quebrar, gerando pontas que causam lesões de esôfago, estômago e obstruções intestinais. O ideal é comprar ossos industrializados e couros comestíveis que são formulados especificamente para atender até a questão de limpar e estimular os dentes.
- Algumas raças de cães não precisam passear nem praticar exercícios?
Todos os animais devem praticar atividades físicas regularmente. Algumas raças mais que outras, mas todas precisam ter esta rotina. O cuidado com relação aos horários deve ser observado pelo tutor para evitar expor o pet ao calor excessivo.
- Existem pets que não gostam de crianças?
Existe. Essa reação, porém, está muito mais relacionada à forma como o pet foi criado do que com a sua raça. Durante a fase de crescimento, os cães, principalmente de guarda, são colocados em canis, de portas fechadas, não sendo socializados com outros animais e seres humanos. Um cachorro que nunca viu uma criança é provável que, ao encontrar uma, seja agressivo.
- Cães das raças Pit Bull e Rotweiller são sempre agressivos?
Pit Bull e Rotweiller são cães selecionados para serem de guarda, o que vai definir a personalidade agressiva ou não é a maneira como são estimulados durante o seu desenvolvimento. Por isso, o convívio social do animal criado para essa finalidade é essencial, sem agressões e confinamento. O adestramento para o aprendizado do respeito e obediência às pessoas é um dos métodos indicados. Jogar no fundo de um pátio, sofrendo maus tratos, é uma maneira totalmente errada de preparar esse cachorro para a função de sentinela.
Andréia Pires
Jornalista - MTb.: 17.976
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