Do outro lado do mundo
Conheça a egressa da Ulbra que se tornou pesquisadora na Austrália
Doutora formada no PPGBioSaúde, Vivian Kahl, contou sua trajetória
Você já imaginou trabalhar em um país com paisagens maravilhosas e qualidade de vida entre as melhores do mundo? Para muitas pessoas, esse sonho parece muito difícil de se concretizar, mas Vivian Kahl, que teve toda sua formação realizada na Ulbra, pode dizer que conseguiu isso. Atualmente, ela reside em Sydney, na Austrália, onde trabalha em um centro de pesquisas de grande relevância. No dia 13 de dezembro ela esteve no campus Canoas para ministrar uma palestra sobre sua pesquisa com telômeros e contar sobre sua experiência no país da Oceania.
Vivian Kahl se graduou em Ciências Biológicas (licenciatura), na Ulbra, em 2010. Após isso, ela decidiu seguir o caminho das pesquisas acadêmicas, cursou mestrado (2013) e doutorado (2017) no Programa de Pós-graduação em Biologia Celular e Molecular Aplicada à Saúde (PPGBioSaúde). No meio desse processo, ela recebeu a oportunidade de fazer o chamado doutorado sanduíche, quando o acadêmico passa um período estudando em uma instituição no exterior. Ela escolheu ir para Adelaide, cidade localizada na costa sul da Austrália, onde permaneceu por seis meses no Commonwealth Scientific and Industrial Research Organisation (CSIRO), um órgão nacional de pesquisa científica.
Após a experiência no CSIRO, durante o seu doutorado, Vivian teve que voltar ao Brasil para defender a sua tese. Antes disso, ela recebeu a proposta para trabalhar no Children's Medical Research Institute (CMRI), em Sydney, na Austrália. Já adaptada e com uma grande oportunidade na sua frente, ela não pensou duas vezes e aceitou, apesar de ter que passar no mínimo um ano, tempo do contrato, longe da sua família e dos amigos. Com a decisão tomada, ela retornou à Canoas para concluir o doutorado e cuidar da mudança. Passado quase um ano desde a partida em definitivo para Sydney, ela retornou para passar férias, rever família e amigos, e também para contar sobre como é a sua vida do outro lado do mundo para os seus ex-professores e acadêmicos do PPGBioSaúde.
Confira a conversa completa com a egressa Vivian Kahl
Ulbra - Como foi o início da formação na Ulbra e o que motivou essa escolha?
Vivian Kahl - Eu comecei a minha graduação em 2006, no campus de Gravataí, onde eu morava. E fazer Biologia, honestamente, sempre foi um sonho bem grande pra mim. Dois motivos me fizeram escolher a Ulbra: a proximidade da minha casa e a avaliação do curso na época, ele era muito bem visto. Eu fiquei muito empolgada. Logo após o meu primeiro ano lá, eu já tinha essa vontade de fazer pesquisa em laboratório, mas ainda não havia essa estrutura no campus de Gravataí, então acabei migrando para a unidade de Canoas.
Ulbra - O que a Ulbra fez pela formação acadêmica e profissional
Vivian - Eu sempre tive muito suporte de todos os professores. Então, todos os professores da graduação, que sabiam que eu era aluna de iniciação científica, me incentivavam a falar sobre isso em sala de aula. Conversar e entender o que está sendo visto no laboratório que se associa com o que está sendo visto em sala de aula, o que se leva de conhecimento da sala para o laboratório. Sempre teve essa troca muito interessante da parte acadêmica com a parte de pesquisa. Isso foi muito importante.
Outra questão é o incentivo das bolsas de iniciação científica. Para o aluno da graduação, é uma das coisas mais importantes que se pode ter, ainda mais quando se estuda em uma universidade privada. A bolsa era um incentivo muito grande pra mim, porque eu queria fazer aquilo independentemente do dinheiro, mas foi muito positivo para me ajudar com transporte e alimentação sem que eu precisasse me preocupar com isso.
Ulbra - A orientações dos professores foi um diferencial?
Vivian - No laboratório, eu sempre tive orientadoras como a professora Jaqueline e, posteriormente, a professora Juliana e colegas que orientavam. Nós dividíamos perguntas, trocávamos conhecimento, e isso é uma coisa que é constante e a Ulbra sempre deu muito incentivo a isso. Quando tínhamos as semanas acadêmicas da Biologia, sempre me encantava a amplitude das atividades, com pessoas da botânica, da zoologia, da pesquisa, da genética, que sempre foi a parte que eu me interessei mais. Então, tudo isso fez com que as coisas se complementassem mais.
Ulbra - E quanto a estrutura e apoio na pós-graduação?
Vivian - Eu não estou mais aqui, mas eu ainda chamo de "nossa pós-graduação" e isso é muito engraçado. Eu realmente me sinto em casa quando estou aqui. Nós sempre tivemos uma estrutura muito legal. Financeiramente falando, é bem difícil fazer pesquisa no Brasil, ainda mais em universidades privadas, que não recebem tanto incentivo do governo, então temos que nos provar sempre mais. E esse apoio eu sempre senti na pós-graduação, com incentivo contínuo dos professores. Quando eu resolvi aplicar para a bolsa de doutorado sanduíche, eu queria para quatro meses, e o professor Rafael me disse para eu tentar seis meses, já que tínhamos essa possibilidade.
Outra coisa que me fascinava muito era poder participar dos Salões de Iniciação Científica, pois ficávamos um ano dentro do laboratório, trabalhando em projetos diversos, ajudando alunos de mestrado e doutorado ou então desenvolvíamos nossos próprios projetos e, no final do ano, geralmente em outubro ou novembro, apresentávamos o nosso próprio trabalho, aquilo que a gente desenvolveu. Era um momento sempre muito nervoso, muito tenso, mas os próprios professores que avaliavam eram muito incentivadores, faziam perguntas e críticas construtivas. Então, todo esse suporte foi muito importante para a minha autoconfiança e para eu saber que tinha um currículo bom para tentar voos mais altos, como esse emprego na Austrália.
Ulbra - Qual a comparaçã que faz entre os laboratórios brasileiros e australianos?
Vivian - Uma coisa que me impressionou bastante quando fui para a Austrália pela primeira vez, em 2014, foi ver que nossa estrutura não é tão diferente assim. Nós sempre temos essa ideia de que os laboratórios de países de primeiro mundo são sensacionais, tudo muito tecnológico, que nós estamos muito atrás. No entanto, não é bem assim. Nos falta verba e incentivo, principalmente para pesquisa científica e tecnológica, mas a gente não está tão atrás. Nós temos muita condição e potencial.
Por termos essas dificuldades financeiras, eu percebo que nós, alunos e pesquisadores brasileiros, somos muito valorizados, por conta da nossa criatividade em trabalhar com poucos recursos. Para eles, é tudo muito fácil. Precisou, tem dinheiro para comprar. Precisou, tem o equipamento para resolver. E a gente não tem isso. Então, eu percebo que eles ficam um pouco desesperados quando existe um pequeno problema e, normalmente, nós brasileiros temos uma sugestão para resolver de forma mais criativa.
Ulbra - Como foi a decisão de continuar na Austrália após a conclusão do doutorado?
Vivian - Algumas coisas pesaram mais. Uma delas, infelizmente, é a decadência de investimentos na ciência do Brasil, pela falta de estrutura que nós enxergamos, eu não sabia qual seria minha perspectiva de emprego aqui. A segurança pública é algo que me apaixona também. É muito seguro andar na Austrália. Eu trabalho dentro do trem com o computador aberto, durmo sem preocupação nenhuma com as minhas coisas dentro do transporte público, caminho na rua sozinha de noite. Então, esses benefícios são maiores que as desvantagens da distância.
Ulbra - E as dificuldades de adaptação à nova vida em outro país?
Vivian - A primeira dificuldade que eu tive foi a questão do fuso-horário. Acho que, inclusive, é a maior de todas. Os quatro primeiros dias são imprestáveis, pois você não dorme na hora certa, não acorda, é muito difícil. Além disso, dificulta o contato com a família, com os amigos e também questões profissionais. Por exemplo, nós temos uma parceira francesa e a diferença é de nove horas, então preciso realizar ligações e videoconferências de noite. Culturalmente, a questão da alimentação é algo que dificulta também. É muito diferente. Eles têm uma influência muito grande da gastronomia asiática. Até haver adaptação com temperos, rolou muita dor de estômago (risos), rolou muita dor de cabeça por um determinado tempero que eu não era acostumada a comer.
Na pesquisa, o que mais me impressionou, e foi de mais difícil adaptação, creio que foi o sentimento de culpa quando eu desperdiçava determinado reagente, porque no Brasil é muito difícil ter esse acesso, devido aos valores dos produtos. Lá na Austrália, não existe muito isso, pois eles têm de sobra. Esse choque cultural e financeiro na área da pesquisa foi uma coisa que me deixou bastante impressionada no começo. Outra coisa bem diferente é a forma de se pedir verba. No Brasil, aplicamos para editais, através da universidade ou do orientador, e lá é você como indivíduo que aplica, entre outras diferenças nas regras desses editais, com várias especificações.
Ulbra - Quais os seus planos para o futuro profissional na Austrália?
Vivian - Os contratos na Austrália são de um ano, com possibilidade de renovação. Agora, em fevereiro, eu fecho esse um ano e já tenho proposta para renovar. Meus próximos planos, com relação a trabalho, são continuar trabalhando no projeto que apresentei aqui, que vai no mínimo até 2020, e um outro projeto que estou iniciando agora em janeiro, que é relacionado a um edital que eu apliquei e ganhei uma verba. É um primeiro edital que eu ganho como pesquisadora na Austrália, então foi muito significativo para mim. É um projeto novo que vou começar, de uma metodologia que eu nunca trabalhei na vida, então vai ser muito desafiador, mas é o tipo de coisa que eu gosto.
Com relação à vida social e particular, eu sou residente permanente na Austrália e não tenho intenção de voltar a morar no Brasil, inclusive pretendo pedir a cidadania australiana assim que possível. E, a longo prazo, eventualmente, eu pretendo ter o meu próprio laboratório de pesquisa, caso surja a oportunidade. No entanto, isso já demanda muitas coisas.
Leonardo Magnus
Jornalista Mtb 19305/RS
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