Responsabilidade Social
Novos projetos extensionistas serão realizados no Quilombo do Areal
Apoio multidisciplinar acontece desde 2015 na comunidade
Uma parte da história negra de Porto Alegre foi lembrada na tarde desta segunda-feira, 27 de março, pela secretária da Associação Comunitária e Cultural Quilombo do Areal, Fabiane Xavier, e pelo presidente da entidade, Alexandre Ribeiro, para a comitiva da Ulbra, que foi convidada para um café informal na sede da entidade.
"Não temos convênios, nem verbas. A Ulbra foi a primeira instituição de ensino superior que entrou no Quilombo para conhecer os nossos problemas e se colocou à disposição para realizar esta parceria", disse Fabiane, que entre uma conversa e outra, relembrou o início da região chamada de Areal da Baronesa, no século XIX.
Ao ouvir os relatos dos moradores sobre os avanços em cultura e educação, desde o acordo de cooperação firmado com a Associação, em 2015, o reitor Marcos Fernando Ziemer demonstrou satisfação em conhecer de perto o trabalho realizado. "Nosso compromisso enquanto instituição de ensino se completa quando alcançamos o propósito da Universidade: levar conhecimento através de ações como essas e, com isso, produzir transformações sociais", enfatizou..
Os cursos de Odontologia, Fotografia, Estética e Cosmética, Gestão Financeira, Matemática EAD e os Programas de Pós-graduação em Promoção da Saúde e Educação estiveram envolvidos com os projetos desenvolvidos desde o início da parceria. Sessões de cinema sobre o protagonismo negro, rodas de conversa com resgate da cultura através da culinária e produção de um documentário são algumas das diversas ações realizadas. O curso de Matemática EAD utilizou a etnopedagogia para ensinar as crianças matemática através de jogos africanos, promovendo aprendizagens a partir das raízes hereditárias.
Ziemer recebeu sugestões de outras atividades que poderão auxiliar as crianças. De acordo com a presidente do Instituto Cultural Integração do Areal da Baronesa do Futuro, Cleusa Astirraga, 60 crianças participam de oficinas de música e dança durante a semana. Cerca de 40 estão na escola de samba Areal do Futuro. "A nossa ideia é que possamos ter o apoio do curso de Design de Moda para criação e confecção de fantasias dos novos foliões", disse. Reforço escolar e intensificação das ações preventivas de saúde bucal foram outros projetos sugeridos.
O trabalho multidisciplinar que está sendo realizado no Quilombo é fruto do diálogo da Universidade com o Instituto de Assessoria a Remanescentes Quilombolas do RS (IACOREQ). Em 2015, os moradores construíram uma pauta de atividades que foram planejadas com a Ulbra. De acordo com a diretora de Assuntos Comunitários da Universidade, Simone Brum Imperatore, o trabalho realizado consiste em empoderar a comunidade para que, em articulação com diferentes entidades, desenvolvam ações contínuas para a deposição da invisibilidade quilombola no Rio Grande do Sul. "Quando firmamos o acordo de cooperação, perguntei a eles o que eles esperavam da Ulbra. E eles disseram que esperavam que as pessoas passassem a enxergá-los como parte da comunidade porto-alegrense, e esta tem sido a diretriz de todos os que trabalham no Areal", disse a diretora emocionada. Acompanharam a comitiva o vice-reitor, Ricardo Willy Rieth e os pró-reitores de Administração e Acadêmico, José Paulinho Brand e Antônio González Hernández, respectivamente.
Preconceito é sublinhado em documentário
Quando iniciou o primeiro curso com os moradores, o professor Claudio Schubert não sabia que ia dar tão certo. Os participantes foram preparados para a comunicação profissional, em 2015. Aprenderam, entre outras coisas, como se comunicar em uma entrevista de emprego. Na época, a comunidade entendia que os jovens precisavam ser instrumentalizados para o mercado de trabalho. "Percebemos que a autoestima deveria ser trabalhada com os jovens e criamos outro projeto para trabalhar o enfoque da resiliência, com a narração de suas experiências. Como um autorretrato", explicou o professor do Programa de Programa de Pós-graduação de Promoção à Saúde. "O conhecimento transmitido a eles no curso de comunicação profissional contribuiu para um resultado surpreendente", finalizou o docente. Jenaina Alvarez é uma das alunas que finaliza o documentário sob orientação de Shubert. "Nós escolhemos, entre tantos temas, o que identificasse as maiores dificuldades do nosso dia a dia. Escolhemos o preconceito racial e social. Eu já sofri por ser negra e por ser pobre", disse a estudante.
Resgate da identidade
O resgate da história do Quilombo do Areal começou a ser feito pela antiga presidente da Associação, Gessi da Rosa Fontoura. A falta de conhecimento da importância histórica da região distorceu o termo quilombo, que passou a ser entendido como escravidão. "O conhecimento de nossa história influencia positivamente a autoestima dos moradores. Com o tempo, os jovens estão se reconhecendo como quilombolas. Trabalhamos muito pelo resgate de nossas identidades. As crianças sofriam bullying no colégio. Hoje, elas já respondem: sou quilombola com muito orgulho!", relatou Fabiane. Atualmente, a assistente social da Ulbra, Jacicleia Stork, está realizando um levantamento socioeconômico da comunidade.
Quilombo resistiu às ações de urbanização
O Areal da Baronesa teve início no século XIX, quando passou a ser reduto de ex-escravos e descendentes, que ocupavam a chácara da Baronesa do Gravataí. Ela deixou as terras para os seus escravos. O espaço de 4,5 mil metros quadrados fica na avenida Luiz Guaranha, rua sem saída onde vivem 80 famílias. A comunidade herdou a área conhecida por ser uma das primeiras ruas de Porto Alegre, com casas geminadas que estão preservadas pela importância histórica.
O Quilombo do Areal é um dos únicos que resistiu a todas as mudanças causadas pela urbanização da capital. Com o crescimento da cidade, as comunidades negras foram sendo despejadas de suas casas e levadas para as periferias. Os primeiros moradores da Lomba do Pinheiro e Restinga, por exemplo, eram remanescentes de quilombos.
Caren Moraes
jornalista - Mtb 11.772
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